terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Mar e céu


Voltei.. acordei agora de noite pensando isso.. depois lendo vi que dialoga com outras poesias minhas.. beijos para os queridos visitantes!


Uma fábrica se construiu sozinha

com ferramentas de nuvens,

suspensa no ar

Havia funcionários de tantos nomes

Um me chamou a atenção

No fim de todo o trabalho

Luvas na mesa, rosto corado

Não havia mais cimento

Mas um som rompia esse homem

Era um tinitar contínuo no chão

Uma melodia fria e peculiar

A noite rasgava os horários

O silêncio dominava o abrigo

Mas esse som bem mais que o infinito

teimava em chamar a loucura

Era um ritmo de estranha tortura

Mas intrigante, supeito de se impor

O dia nas engrenagens acabara

E aquele ruído lembrava as tarefas

Na verdade era uma música sem trégua

Sem chance de sossego

Era um canto de rotina, um tom de medo

Era um verso de persistência

que lembrava a cadência de marchar

Mas aquele homem queria se libertar

Às vezes o ruído crescia,

como um dragão sem tamanho

Às vezes ficava minúsculo e risonho

e se transformava em goteira.

Mas o fato é que era um canto que não se dizimava

Pela vida inteira

Cada novo argumento que o fizesse acabar

Outro o fazia recomeçar

Tantos homens naquela fábrica não ouviam o som,

já tão acostumado.

Mas o operário tinha ouvido refinado

e quem se refina escuta além.

Blém, blém, blém, algo chamando, enquanto repelia

Era uma angústia de nunca acabar o dia

O homem ia além daquele ruído

Os sinos, os pássaros, os pianos

Nada abafava o canto tímido,

mas tão suave e cruel inimigo.

As máquinas, já cansadas,

queriam enfim parar.

Mas o martelo a martelar

O martelo a martelar

Talvez se não houvesse pinos,

não houvesse em que bater

Não, o martelo não batia em nada

O martelo só queria SER

O jogo interrompido no meio

A mesa posta, a moça pronta,

o martelo a martelar.

Tudo estranhamente no lugar

O operário não sabia se era ele

que se punha a trabalhar

Mesmo nos braços de um lindo sonho

o martelo a martelar

Queria ele desencantar esse feitiço musical medonho

e ir além das barreiras do som

O martelo pode ser forte, mas não é bom

Deve aprender a descansar

E cada pino voando na lua

e cada tino zombando do martelar

Fragmentos de ex-martelo na rua

Fim do eterno fixar

Um som de vidros se desfazendo em espuma

e o mundo perdido, e lindo,

sem ter o que martelar.

4 comentários:

Anônimo disse...

Lindo, fiquei arrepiado.

Maldito martelo que continua a bater, queria quebrar o martelo que me tormenta, ou pelo menos ouvir uma boa música para abafar, quem sabe até uma conversa de amigos para me dispersar.

Adorei.

Albergaria disse...

"Cada novo argumento que o fizesse acabar

Outro o fazia recomeçar

Tantos homens naquela fábrica não ouviam o som,

já tão acostumado.

Mas o operário tinha ouvido refinado

e quem se refina escuta além."


Esse trecho acho que traduz, ou melhor, resume a essência do nosso círculo de amizade... nós estamos sempre em busca de refinarmos uns aos outros para escutar além...

Impossível não dizer que ficou foda!

Beijão Cris

Eliane Gerk disse...

Um martelo batendo nas nuvens...
Ruídos de pancadas no céu...
E a brisa do paraiso?
e a suavidade do céu?
Que estranha fábrica...

Anônimo disse...

Um martelo que bate no ritmo de um coração esperançoso, sempre constante e firme na sua certeza. O que constrói este martelar? O que nos ensina este ritmo feito deste martelar? Um ex martelo que não teve seu merecido descanso depois de tanto trabalho... de tanto martelar... É triste como um coração que não teve no seu bater a quem amar.