segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Portas

Se um dia alguém te perguntar sobre mim,
explica sorrindo que não nasci assim.
Fui fruto mordido, só por fora
e conservo ainda caroço oco (e louco)
onde guardo o infinito da minha história.

No traço do meu gingado,
tem um homem mal-sonhado.
Eu idealizo, e insisto,
mas no fundo não sou as convenções que visto.

Eu não cobro da multidão que me tire essa ciência
porque a multidão - em festa ou em luto - não pensa.
É um arquipélago completamente dividido
no qual o dormir de cada um é um rito,
uma passagem para um outro isolamento.

Eu me movimento.
E na cadência dos corpos que se fundem ao meu,
eu quero descontrolar o que é meu e teu.
Quero um amar livre para que se enterre o pecado.
Na lei da minha terra,
só os falsos fazem algo errado.

E ver, sentir, se deixar levar,
sem se prender à memória
porque tudo é construção irrisória.
Tudo é caretice profana
quando se espera mais da mente humana.

Sem as noções mesquinhas de espaço e tempo,
mas em êxtase por cada detalhe, de todo momento.

Se alguém te perguntar sobre mim,
responda que não menti.
Mas pensei tempo demais sobre o pensar terceiro
e perdi meus dias com o viver alheio.

Até hoje.
Vivi uma busca,
mas encontrei meu centro.
Vejo agora o raiar solitário do amanhecer para dentro.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

No domingo...

Roupas jogadas na sala
Um copo de vodka ainda pela metade
A cama desarrumada agora em silêncio,
entortada e sem lençol,
retrato da vontade

A pia resolveu entupir bem naquela noite
Mas ficou lá cheia, deixa pra depois
Um pedaço de pizza ainda no forno
não vai saciar a fome por nós dois

Um filme na cabeça, com personagens reais
Não tão reais quanto se imagina...
Uma calcinha no tanque, meio menina,
vai ser levada, deixando o desejo pra trás

Os cigarros queimados no cinzeiro
ainda se encontram, ainda têm certeza
A janela aberta solta o perfume
do que foi o jogo de conquista naquela mesa

E a semana começa de novo
Visto a gravata, meu terno xadrez
Quando será que terei nova lembrança
da minha vida revirada, da casa desarrumada,
da vontade de estar vivo, de vez...