Voltei.. acordei agora de noite pensando isso.. depois lendo vi que dialoga com outras poesias minhas.. beijos para os queridos visitantes!
Uma fábrica se construiu sozinha
com ferramentas de nuvens,
suspensa no ar
Havia funcionários de tantos nomes
Um me chamou a atenção
No fim de todo o trabalho
Luvas na mesa, rosto corado
Não havia mais cimento
Mas um som rompia esse homem
Era um tinitar contínuo no chão
Uma melodia fria e peculiar
A noite rasgava os horários
O silêncio dominava o abrigo
Mas esse som bem mais que o infinito
teimava em chamar a loucura
Era um ritmo de estranha tortura
Mas intrigante, supeito de se impor
O dia nas engrenagens acabara
E aquele ruído lembrava as tarefas
Na verdade era uma música sem trégua
Sem chance de sossego
Era um canto de rotina, um tom de medo
Era um verso de persistência
que lembrava a cadência de marchar
Mas aquele homem queria se libertar
Às vezes o ruído crescia,
como um dragão sem tamanho
Às vezes ficava minúsculo e risonho
e se transformava em goteira.
Mas o fato é que era um canto que não se dizimava
Pela vida inteira
Cada novo argumento que o fizesse acabar
Outro o fazia recomeçar
Tantos homens naquela fábrica não ouviam o som,
já tão acostumado.
Mas o operário tinha ouvido refinado
e quem se refina escuta além.
Blém, blém, blém, algo chamando, enquanto repelia
Era uma angústia de nunca acabar o dia
O homem ia além daquele ruído
Os sinos, os pássaros, os pianos
Nada abafava o canto tímido,
mas tão suave e cruel inimigo.
As máquinas, já cansadas,
queriam enfim parar.
Mas o martelo a martelar
O martelo a martelar
Talvez se não houvesse pinos,
não houvesse em que bater
Não, o martelo não batia em nada
O martelo só queria SER
O jogo interrompido no meio
A mesa posta, a moça pronta,
o martelo a martelar.
Tudo estranhamente no lugar
O operário não sabia se era ele
que se punha a trabalhar
Mesmo nos braços de um lindo sonho
o martelo a martelar
Queria ele desencantar esse feitiço musical medonho
e ir além das barreiras do som
O martelo pode ser forte, mas não é bom
Deve aprender a descansar
E cada pino voando na lua
e cada tino zombando do martelar
Fragmentos de ex-martelo na rua
Fim do eterno fixar
Um som de vidros se desfazendo em espuma
e o mundo perdido, e lindo,
sem ter o que martelar.